Somos todos iminentes. Vivemos num eterno devir. Estamos sempre à beira de nosso futuro. Somos, por natureza, expectativa (Luís Fernando Verissimo)
O homem é um animal simbólico (E. Cassirer). O símbolo dá o que pensar (P. Ricoeur). O que é o Símbolo? É o dizer da linguagem, que produz o ser humano!
Na linguagem entrecruzam-se a memória, a expectativa e a certeza-incerta. E deste ponto, de certa-incerta, somos capazes de retroceder ao primeiro ato humano; somos capazes de prospectar o mundo por vir. Na linguagem entrecruzam-se sentimentos, emoções, paixões, sonhos, desejos e razões lógicas e ilógicas, racionais e irracionais. Na linguagem comunicamo-nos e nos velamos, entramos nos negócios humanos (H. Arendt) e deles nos ocultamos.
A linguagem supõe e nutre a diversidade dos interesses, a diversidade das expectativas, a diversidade das concepções de si-mesmo. Quando me penso, não sou unanimidade, há tantos Claudios em mim que se compõem e se descompõem, mas há este Eu que os mantém numa frágil unidade de sentido. A linguagem é este fio que costura a possibilidade de onde a consciência emerge.
A nossa capacidade de autocompreensão passa pelo acesso à cultura e, em geral por um conjunto de mediações simbólicas. Nos educamos em um mundo que se narra. Este é o argumento principal de Ricoeur: construímos nossa identidade narrativamente (Barcena).
O símbolo dá o que pensar, porque não é unívoco, não é literal. O símbolo é metafórico, está entre a verdade e o significado, entre as convicções que tenho e o porquê as tenho e o como as apreendi.
Em algum lugar Bakhtin diz que é ingênuo pensar que no ato de olhar no espelho nos encontramos, como se houvesse uma fusão, uma coincidência do extrínseco com o intrínseco. Para Bakhtin não nos vemos no espelho com nossos olhos, mas com os olhos do mundo. Tenho de passar pela consciência do outro para me construir. O símbolo é o encontro do que sou na voz do outro. Sem esta voz eu me iludo, na certeza de que sou. Pensar não é estar só.
A compreensão do sentido, do significado da visão de mundo, da verdade do outro está sempre ameaçada. A polissemia do símbolo, nos leva, quando centrados dogmaticamente, à impossibilidade de compreensão de um enunciado, dos valores propagados no seio de uma cultura.
Os mitos, as opiniões e os preconceitos formam o ambiente social em que banha nossa consciência (Ortega e Gasset). Edgar Morin fala que a educação do futuro tem que estabelecer uma ética da compreensão. Penso que tal ética consiste em significar e resignificar constantemente o mundo tomando como guia um pressuposto kantiano: Age de tal maneira que uses a humanidade tanto na tua pessoa como na pessoa do outro sempre e simultaneamente como fim e nunca como meio. Neste caminho, “a prática do autoexame permanente é necessário, já que a compreensão de nossas fraquezas ou faltas é a via para a compreensão das do outro.
Educar é um encontro conflitivo, um encontro de desiguais, entre quem já perfez um caminho e o que inicia uma caminhada. Ela transita entre o conservar e o transformar (José Machado). Educar é uma ação que remete a duas atitudes: a reação e a resposta.
Segundo o Aurélio, a ação não é um simples fazer coisas, mas a expressão de uma vontade livre e consciente. Por isso ela pode ser reativa ou responsiva. A ciência, por exemplo, trabalha com o principio que entre ação é reação há uma simetria. Nessa dinâmica, toda ação gera uma reação. É como dizer: bateu-levou. No entanto, quem vive estritamente de reação é o animal. A dimensão humana não é a da reação e sim a da resposta. O que se espera do ser humano é que responda. O fazer consciente que a ação significa, me leva a dar uma resposta que é uma nova ação, um novo fazer que é consciente. A expectativa ética em educação é de uma ação totalmente assimétrica, imprevisível, irreversível.
A maior dificuldade no processo educativo é a apatia ou a conformação. A maior dificuldade não está em lidar com quem não sabe as coisas, a dificuldade é com quem não quer saber!
Esta é a violência simbólica (Bourdieu) posta a nossos alunos e a nossos professores é a desconstrução ideológica de seu papel: A simbólica da escola inautêntica (Heidegger): a escola pública é caracterizada, nos discursos oficiais e na grande impressa como o espaço do fracasso.
O profissional que nela atua é um fracassado, ele não sabe ensinar, porque desejava ser outra coisa, ele está, deficientemente, professor. Sujeitado às verdades e normas dadas, não encanta o aluno. Este ora é um coitado, ora um ainda-não delinquente. Muito das vezes “esforçado, mas limitado, não aprende”. A repressão que a escola exerce é por ineficiência, pela despersonalização da ação educativa. Nem aluno, nem professores, são mais os sujeitos da educação. Há trinta anos estamos a descontruir a imagem da escola como espaço de conhecimento. Há trinta anos estamos desconstruindo a imagem do professor como mediador-significante do mundo. Há trinta anos estamos desconstruindo a imagem do aluno. Nos ambientes escolares transitamos da apatia e conformação à transgressão irrefletida das normas e à violência gratuita.
Toda educação é Paideia e Politéia (Prof. Antônio Joaquim Severino), então é preciso no “meio das trevas encontrar uma luz” (Jaspers).
Devemos transitar da ideologia à utopia (M. Tavares). Na simbologia utópica da escolar o educar ilumina e fundamenta o ensinar, que deixa de ser uma técnica utilitarista voltada para o saber fazer, e passa a ser uma ação no sentido arendtiano. O educar assegura a condição humana de pluralidade, ou seja, institui um espaço comum público de ação e discurso em que os sujeitos da educação, professor-aluno, se descobrem como pessoas singulares mas não ensimesmadas, que escapam constantemente a qualquer categorização e se abrem um para o outro no discurso. O que permeia a relação professor-aluno não é a utilidade do saber, mas o valor em saber. Ao como fazer para “ter” (como diz um amigo meu, a sociedade espera manuais de como fazer) o fio condutor da Paideia e o “saber ser”.
Este é o desafio que se coloca à escola utópica, constituir uma Politéia mediada pela Paideia, e cuja finalidade e a formação de homens enquanto sujeitos construtores da sua própria personalidade.
Esta educação só se dá às margens do Estado, que privilegia, e não poderia ser diferente, a educação ideológica. Temos que nos arriscar e insistir, enquanto houver utopia, o que acha vencer não pode encerrar a história.
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Formado em Filosofia (Licenciatura), casado, dois filhos, trabalha na Secretaria de Educação de São Paulo, leciona Filosofia no Ensino Médio. Coordena Oficinas Culturais na Associação Cultural Opereta, onde ensina Italiano. É membro do conselho do Instituto de Formação Augusto Boal. É membro fundador da Associação Cultural Rastilho (A.CURA). Lançou VACUOS MUNDI. E-mail:cdomimgosfernandes@uol.com.br
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